Helaine Martins: uma despedida
Parada cardiorrespiratória abreviou a importante luta por direitos humanos encampada por editora do ‘Estadão Expresso Na Perifa’
“Eu amo sábado”, escreveu em sua conta do Instagram, no dia de 27 de março de 2021, a jornalista Helaine Martins.
Ela era editora deste Estadão Expresso na Perifa. “(…) Acordo antes do despertador tocar, não leio notícias, tomo banho de sol na área de serviço que promovi ao posto de varanda, cuido das plantinhas, faço um churrasco de grill, enfeito a taça de gin ou caipirinha, coloco um samba pra tocar, canto alto que me apaixonei pela pessoa errada, danço sozinha pela casa e consigo sorrir. Sábado faço meu próprio pagode.”
Essa qualidade de extrair a delicadeza dos dias mesmo em tempos desafiadores, somada ao ativismo antirracista, feminista e das causas sociais, era o tecido dos dias de Helaine. Contadora de histórias e parceira de trabalho cheia de talento e generosidade, morreu no sábado, 3 de julho de 2021. Tinha 41 anos.
Uma parada cardiorrespiratória interrompeu abruptamente o pagode particular aos sábados e o sorriso luminoso. Abreviou também uma importante história na luta por direitos humanos. Ela usava o jornalismo para construir pontes.
Nani, Lani, Lane, He, como a chamavam amigas e amigos, andava entusiasmada. Em sua casa no Tatuapé, havia finalmente se tornado “mãe de plantinhas”. No trabalho, o novo projeto profissional – edição e produção de conteúdo de dentro das periferias para o mundo, em parceria com coletivos do Brasil – fazia brilhar seus olhos.
“Sou apaixonada mesmo, não nego, e tenho um propósito como jornalista, sabe? O Na Perifa tem tudo a ver com isso”, disse em uma das últimas conversas com a colega de redação.
“Nas últimas semanas, meses, eu liguei muitas vezes para ela”, conta um dos amigos mais próximos, Alexandre Suenaga. “Quando ela me contou desse trabalho, falou do sonho de criança [ser jornalista]. Tinha essa história de realizar um sonho compartilhado [com a mãe]. Estava muito, muito, feliz de trabalhar com a temática que tem muito a ver com a luta dela.”
Nascida no bairro da Glória, na cidade do Rio de Janeiro, em 12 de maio de 1980, Helaine Martins cresceu em Belém, onde ainda vive sua mãe, Heloísa. Formou-se em jornalismo pela Universidade Federal do Pará. “Aos 10 anos, meu presente de aniversário foi uma assinatura do jornal O Globo e eu lia jornal todos os dias”, contou em entrevista para a plataforma Plano Feminino.
Já em São Paulo, para onde se mudou em 2008, passou a trabalhar como freelance na geração de conteúdo e em projetos de causas sociais. Pós-graduada em Cultura, Educação e Relações Étnico-Raciais pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, criou, entre outras iniciativas, o projeto “Entreviste um Negro”. Manifestação concreta da batalha de Lane pelo jornalismo plural e inclusivo, o “Entreviste” conecta jornalistas a profissionais negros para que estes sejam ouvidos, sejam fontes, em reportagens.
Sepultada nesta terça, 6 de julho, na cidade de Santo André, região metropolitana de São Paulo, Helaine era separada e não tinha filhos. Deixa mãe, irmão, sobrinho e uma legião de amigos e colegas.
O Estadão Na Perifa lamenta profundamente sua partida e agradece pela contribuição fundamental. Daremos continuidade ao trabalho que exerceu com vontade e comprometimento. Seguiremos, juntas e juntos, construindo e fortalecendo as pontes que Helaine ajudou a alicerçar.
Quer uma navegação personalizada?
Cadastre-se aqui
0 Comentários