COP-30: o que esperar da mobilidade urbana de Belém durante a conferência climática da ONU?
Pesquisadora da UFPA alerta para desafios estruturais da cidade; participantes de outras COPs contam como funcionaram os transportes em edições anteriores

Belém se prepara para receber a COP-30, conferência climática da ONU, com expectativa de 50 mil participantes de todo o mundo. A mobilidade urbana é um dos principais desafios para a capital paraense, uma cidade marcada por infraestrutura precária e transporte público sobrecarregado. A pouco mais de cinco meses do evento, marcado para ocorrer entre 10 e 21 de novembro, ainda não há um plano de mobilidade divulgado oficialmente, o que preocupa especialistas da área.
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“A gente ainda não tem um projeto operacional, e isso nos preocupa bastante. Não é só ter ônibus, é preciso saber de onde essas pessoas vão sair, onde vão chegar, como vai ser a distribuição da frota e a integração com o restante da cidade”, explica Regina Célia Brabo Ferreira, docente da Faculdade de Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará (UFPA), que pesquisa a mobilidade urbana em Belém no contexto da COP.
Conforme a professora, o transporte coletivo em Belém funciona hoje com cerca de 1.800 ônibus convencionais, que já operam com superlotação no dia a dia. A cidade conta com um único corredor BRT parcialmente concluído e sem linhas alimentadoras. “Por mais que se tenha decretado suspensão das aulas no período da COP, o comércio e os serviços continuarão. Somando isso aos 40 ou 50 mil participantes do evento, é difícil acreditar que o sistema atual dará conta da demanda”, afirma.
O que Belém promete até agora para a COP-30?
Entre as obras em andamento estão a criação do Parque da Cidade, onde a COP acontecerá, ciclovias, calçadas e a instalação de equipamentos como faixas de pedestres luminosas e totens informativos com Wi-Fi. As chamadas “vias inteligentes” buscam para melhorar o acesso ao Hangar e à região da Conferência.
Além disso, há promessas de novas linhas de ônibus, uso de 300 veículos Euro 6 e operações por aplicativos e transporte por táxi com bolsões de estacionamento. Porém, o transporte hidroviário, apontado como estratégico dada a geografia de Belém, ainda não recebeu atenção, alerta Regina. Esse cenário ocorre mesmo com a reforma do Terminal de Outeiro, que vai receber transatlânticos com até 6 mil leitos.
“Faltam conexões entre os modais. Até agora, não vimos projetos que priorizem o transporte fluvial ou que integrem de forma eficaz ônibus, bicicleta e caminhada. Os projetos aparecem de forma isolada e não está claro o que realmente é prioridade”, completa a professora da UFPA.
Caminhada e bicicleta: esperança ou risco?
Durante o Círio de Nazaré, evento religioso que movimenta milhões de pessoas em Belém, o deslocamento a pé ganha protagonismo. Mas, para a pesquisadora, é arriscado comparar com a COP. “No Círio, as vias são fechadas, o que facilita a caminhada. Já no caso da COP, os deslocamentos vão convergir para um único ponto e as calçadas de acesso são em muitos casos inexistentes ou inadequadas”, diz.
A cidade tem cerca de 126 km de ciclovias, mas a maioria não tem interligação. Um antigo serviço de bicicletas compartilhadas acabou 2020 e ainda não foi retomado. Para a COP-30, algumas melhorias em vias específicas estão previstas. Além disso, o governo do Estado do Pará, em parceria com a prefeitura de Belém, asfalta ruas por toda a cidade.
Como funcionou em outras COPs
Participantes brasileiros que estiveram em edições anteriores da COP relatam experiências variadas. Em Glasgow, na Escócia, em 2021, o transporte estava organizado, com passes gratuitos para metrô, trem e até bicicletas públicas, de acordo com Roberta Tiso, diretora da green4T. “Usei ônibus elétricos e trem. Com o crachá da conferência, dava para circular por toda a cidade”, lembra Roberta.
Já em Sharm El-Sheikh, no Egito, em 2022, a mobilidade foi mais difícil. “A cidade não tinha estrutura de transporte coletivo. Nós acabamos contratando um táxi particular que nos levava todos os dias”, conta Roberto Speicys, CEO da Scipopulis.
Dubai, sede da COP-28, apostou em estrutura moderna e metrô direto até a Expo City. “Era tudo muito organizado, havia shuttles gratuitos dos hotéis e acesso fácil por transporte público”, lembra Roberta Tiso.
Expectativa e incertezas para COP-30
A ausência de um plano público detalhado para a mobilidade durante a COP-30 levanta dúvidas sobre a capacidade de Belém de garantir deslocamentos eficientes, seguros e sustentáveis. Porém, a Secretaria Extraordinária para a COP garante que esse plano estará público em breve.
“Está todo mundo esperando por esse plano. Mas eu tenho a impressão de que nem quem está no poder sabe exatamente o que vai conseguir entregar até lá”, afirma a professora Regina Ferreira, da Federal do Pará. “A cidade está fazendo o possível, mas a gente corre o risco de ter mais um legado de obras desconectadas, que não resolvem os problemas de quem vive aqui.”
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