Gerando Falcões: ONGs também precisam de governança corporativa

'A gravidade da crise social brasileira pede que as organizações do terceiro setor estipulem metas cada vez mais ambiciosas. Mas é preciso, antes de tudo, ter clareza de quais são esses objetivos – aumentar a receita, recrutar mais voluntários, alcançar novas regiões?'. Foto ilustrativa: Getty Images

18/05/2022 - Tempo de leitura: 4 minutos, 3 segundos

Toda grande empresa conta com um programa sólido de governança corporativa. Assim ela garante, entre outras coisas, o cumprimento de metas e a melhor gestão possível de seus recursos, maximizando o lucro. Também evita crises e até contendas judiciais. Mas por que esse conhecimento deveria ficar restrito ao universo empresarial?

Especialmente durante a pandemia, o terceiro setor provou sua importância para a população das favelas e periferias, garantindo o acesso a direitos básicos. O momento é oportuno para planejar quais serão os próximos passos. Se as ONGs (Organização não governamental) brasileiras desejam crescer de maneira sólida, ampliando ainda mais seu impacto social, é preciso profissionalizar seu modelo de gestão.

O terceiro setor deve aprender com a iniciativa privada a construir bons modelos de governança corporativa. Afinal, se as maiores empresas do mundo utilizam esse conhecimento para multiplicar riquezas, as lideranças sociais precisam garantir que ele também esteja a serviço dos mais necessitados, contribuindo para distribuir riquezas.

A gravidade da crise social brasileira pede que as organizações do terceiro setor estipulem metas cada vez mais ambiciosas. Mas é preciso, antes de tudo, ter clareza de quais são esses objetivos – aumentar a receita, recrutar mais voluntários, alcançar novas regiões? – e qual sua centralidade para o trabalho específico de cada ONG. “Se você falha em planejar, está planejando falhar”, dizia Benjamin Franklin. Planejamento é a palavra-chave.

A gravidade da crise social brasileira pede que as organizações do terceiro setor estipulem metas cada vez mais ambiciosas. Mas é preciso, antes de tudo, ter clareza de quais são esses objetivos – aumentar a receita, recrutar mais voluntários, alcançar novas regiões?

Essas instituições também precisam contar com indicadores claros, que permitam de fato mensurar sua trajetória de crescimento, planejar novas ações e, principalmente, identificar problemas a serem corrigidos. Complementarmente, suas diretorias precisam estabelecer reuniões de produtividade, para que mensalmente ou até semanalmente seja possível acompanhar a evolução de cada indicador e, sempre que necessário, corrigir a trajetória.

Por fim, a realização de auditorias internas é um instrumento fundamental de gestão. Uma instituição que checa periodicamente sua situação fiscal e jurídica passa uma mensagem de solidez para futuros doadores e investidores, demonstrando estar blindada contra futuras crises e preparada para ciclos sustentáveis de crescimento, com base em estratégias coerentes e auditáveis de captação de recursos.

Todas essas práticas constituem o “beabá” do universo corporativo, mas elas ainda não chegaram com força suficiente ao terceiro setor. Isso precisa mudar. Ensinar uma ONG a pensar como uma grande empresa e a gerir profissionalmente seus recursos financeiros e humanos, com o mesmo grau de eficiência cobrado pelo mercado, significa garantir um melhor aproveitamento para esses recursos e, consequentemente, mais resultados na ponta.

A experiência da Gerando Falcões reforça a validade dessas ideias. Por meio do nosso braço educacional, a Falcons University, buscamos dividir, em uma capacitação gratuita que dura seis meses, essas técnicas de gestão às lideranças que fazem parte da nossa rede de ONGs. Dentre elas, selecionamos as mais promissoras para se submeterem a um Programa de Aceleração que envolve desde um aporte financeiro até o acompanhamento minucioso do cumprimento de cada meta. Oferecemos ainda mentorias com lideranças da Rede Gerando Falcões e com executivos de empresas parceiras. Com isso, tornamos acessível para a favela o conhecimento e a experiência de alguns dos maiores líderes do Brasil.

As primeiras 28 unidades que passaram pelo Programa de Aceleração registraram um crescimento de 266% em sua captação de recursos. Antes do programa, essas instituições captavam cerca de R$ 5,1 milhões; depois, sua receita somada subiu para R$ 13,7 milhões. O desempenho dessas ONGs não deixa dúvidas quanto à diferença que um plano completo de governança corporativa pode fazer para uma instituição de caráter social.

O verdadeiro índice de desenvolvimento de uma nação não se mede apenas por seu PIB, mas também por sua capacidade de solucionar problemas sociais, de reduzir desigualdades, de produzir bem-estar para todos

É preciso replicar experiências como essa por todo o país. O verdadeiro índice de desenvolvimento de uma nação não se mede apenas por seu PIB, mas também por sua capacidade de solucionar problemas sociais, de reduzir desigualdades, de produzir bem-estar para todos. O Brasil já possui um elevado número de empresas que competem em pé de igualdade com as gigantes do mercado internacional. Esse nível de excelência em gestão precisa chegar agora ao terceiro setor, impulsionando o trabalho de quem luta para transformar a pobreza em peça de museu.