A situação do mercado automotivo brasileiro deve piorar antes de melhorar. As fábricas ainda estão enfrentando paralisações motivadas por falta de componentes, especialmente semicondutores. Inflação e juros altos pressionam os preços e comprometem o financiamento, o que prejudica as vendas. Mas a crise também abre oportunidades. A indústria já discute a possibilidade de produzir localmente componentes importados que tiveram o fornecimento prejudicado. Pandemia, eventos climáticos em diferentes pontos do planeta (nevasca, incêndios, tsunamis) e mais recentemente a guerra na Ucrânia evidenciaram a fragilidade da cadeia global de fornecimento de autopeças. “É preciso estudar para ver o que faz sentido economicamente (de nacionalizar a produção). A pandemia trouxe o problema, mas estou olhando como oportunidade”, declarou o ex-presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes.
Estes e outros temas foram debatidos no Summit Indústria Automotiva 2022, promovido pelo Estadão. Durante dois dias, o evento online reuniu profissionais de várias áreas que compõem todo o ecossistema necessário para a produção de automóveis. A partir da análise do presente, foi possível traçar um panorama do futuro. O analista de mercado da consultoria britânica GlobalData José Augusto Amorim declarou que o mercado este ano deve ficar abaixo de 2 milhões de unidades. Mas ele considera que, mesmo vendendo menos, a indústria não deve perder faturamento, porque a produção está se deslocando para segmentos de maior valor agregado, caso de picapes e SUVs. Assim, o preço maior compensa o volume menor. No painel “Quando acabará a crise no setor automotivo?”, ele chamou atenção para o fato de que o preço médio dos automóveis subiu de R$ 87 mil em 2019 (antes da pandemia) para R$ 144 mil este ano, alta de 65%. De acordo com suas projeções, em 2024 os SUVs deverão superar a marca de 1 milhão de unidades vendidas. Com isso, irão assumir a liderança de vendas. O mercado total deverá atingir a marca de 4 milhões de unidades apenas na próxima década, prevê o analista.
O presidente da Stellantis para a América do Sul (grupo que reúne marcas como Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e RAM), Antonio Filosa, afirmou no painel “Competitividade da Indústria Automotiva no Brasil” que a indústria brasileira é competitiva mundialmente, mas apenas “da porta para dentro” das fábricas. Segundo ele, do lado de fora dos muros as fabricantes instaladas no País perdem competitividade.
Entre os problemas, ele listou falta de infraestrutura de portos, aeroportos e estradas, além de carga tributária excessiva. No mesmo painel, o presidente do Sindipeças (associação dos fabricantes de autopeças), Cláudio Sahad, enfatizou a excessiva burocracia, chamando atenção para o fato de que no País há empresas com até cem pessoas trabalhando no departamento fiscal e tributário “apenas para apurar impostos”, um trabalho que segundo ele pode ser feito por duas pessoas em outros países.
A burocracia é ainda maior do que a carga tributária. Não é possível gastar mais de dez vezes o tempo necessário para apurar impostos
Claudio Sahad – Presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos
Entregar a peça certa no momento exato na linha de montagem tem sido outro desafio. Um pequeno atraso pode causar a paralisação de todos os funcionários da produção, porque as indústrias trabalham com pouco estoque. Atrasos em navios, falta de contêineres e rodovias em mau estado são alguns dos entraves que prejudicam a logística.
A tecnologia tem sido uma ferramenta fundamental em várias áreas. No transporte, ela serve para aprimorar a eficiência nas entregas. Por meio de monitoramento remoto, fabricantes e transportadoras acompanham o trajeto de caminhões e podem até mesmo corrigir eventuais falhas no modo de condução do motorista. Graças a esse acompanhamento, empresas de transporte conseguem obter redução de combustível e de horas paradas para manutenção.
A atualização remota de software dos automóveis permite que os automóveis mais modernos recebam correções de programas e novas funções da mesma forma como smartphones, sem que o motorista precise agendar visita à concessionária.
Quanto à propulsão e combustíveis, opções como carros híbridos flexíveis, elétricos alimentados por hidrogênio, híbridos com sistema de 48 Volts e caminhões movidos a gás natural são algumas das alternativas, tanto para o presente como para um futuro próximo.
É preciso promover uma descentralização, para equalizar as diferenças entre as regiões e atrair mais investimentos
Antonio Filosa – Presidente da Stellantis na América do Sul, grupo que reúne a FCA e a PSA